sábado, 4 de setembro de 2010

A fantasia da metrópole

Paulo Afonso Linhares

A quintessência da charlatanice é vender fumaça engarrafada. Os comunicadores de todos os matizes e, principalmente, certos donos de veículos de comunicação têm uma enorme capacidade de dourar pílulas e empurrá-las goela abaixo das pessoas ingênuas. Os donos da revista Veja demonstraram essa capacidade com reportagem especial (tipicamente do gênero caça-níquel) publicada na edição de 1º de setembro deste ano, intitulada A Força das Cidades Médias, em que perfila as 20 cidades de porte médio (Hortolândia, Cabo Frio, Marabá, Sete Lagoa, Varginha, Sinop, Araguaína, Ji-Paraná, Barreiras, Petrolina, Taubaté, Anápolis, Rio Claro, Cascavel, Açailândia, Divinópolis, Arapiraca, Mossoró, Uruguaiana e Campina Grande) cujos processos de desenvolvimento econômico as projetam como futuras metrópoles. Quem conhece do métier sabe que a (antes) poderosa Veja (que perdeu enorme contingente de assinaturas nesse anos em que se dedicou a combater cegamente a pessoa do presidente Lula) não faria uma reportagem "especial" somente pela empolgação com o crescimento dessas cidades de porte médio. Algumas cotas certamente foram adquiridas por quem pretendia entrar em tão seleta lista e com um objetivo bem delimitado: usar a reportagem como peça de campanha ou, no mínimo, para brunir as vaidades de alguns alcaides.


O que causa espanto é a superficialidade e a babaquice mesmo da reportagem, além dos erros grosseiros, quando por exemplo noticia que "Jerônimo Rosado batizou todos o seus filhos homens com seu próprio nome e com o número, em francês, da ordem em que nasceram. Seu primogênito foi Jerônimo Premier, o segundo Jerônimo Second e por aí foi, até Vingt-Un Rosado Maia". Nada mais historicamente falso! E ilógico. Ora, se Jerônimo Rosado quisesse nominar os filhos com seu próprio nome seguido de um número - em francês ou em qualquer outra língua - deixaria o número 1 para si próprio, ele seria o tal Jerônimo Premier... A verdade, porém, é outra: "O primeiro Rosado se casou duas vezes. Sua primeira mulher, Maria Rosado Maia, lhe deu três filhos: Jerônimo Rosado Filho, Laurentino Rosado Maia, que morreu 15 dias depois do nascimento, e Tércio Rosado Maia, o primeiro dos numerados. Maria Rosado morreu logo depois do nascimento de Tércio. Deixou um último pedido ao marido: ele deveria se casar novamente. A esposa já estava escolhida: a própria irmã dela, Isaura Rosado Maia. O viúvo cumpriu o desejo da falecida. O casamento de Jerônimo Rosado com Isaura fez a prole crescer. Vieram mais 18 filhos. Todos numerados. Diferentemente do que reza a lenda no País de Mossoró, nem todos receberam nomes franceses. Do terceiro até o décimo, a inspiração para os nomes era o latim. A partir do 11º, e só com a exceção do 12º filho, todos levaram nomes inspirados nos numerais franceses. Foram ao todo 12 homens e nove mulheres. A maioria recebendo Jerônimo ou Isaura como primeiro nome." É o que no bem cuidado site da Coleção Mossoroense (http://bit.ly/b5bAQK). Bem que os coleguinhas da Veja poderiam tê-lo visitado, para não sair por aí a dizer besteiras.

O grave da reportagem é que nem faz um levantamento sério do perfil sócio-econômico de Mossoró, com suas opções de desenvolvimento econômico (petróleo, sal, calcário/cimento, fruticultura irrigada, castanha de caju e cerâmica, para citar os mais relevantes clusters da região), tampouco mostra as mazelas sociais acumuladas por Mossoró. O que dizer de uma "metrópole" que não tem um hospital pediátrico (público ou privado) ou uma maternidade pública? Com os recursos recebidos como royalties do petróleo explorado no Município de Mossoró nos últimos vinte anos - quando foi dirigido por dois médicos e uma enfermeira - bem que esses hospitais poderiam ter sido edificados. E não foram. Se um pobre quebrar um braço em Mossoró só receberá atendimento na cidade de Russa, no vizinho Estado do Ceará. E as favelas? E a violência urbana desenfreada? E a poluição do Rio Apodi no trecho urbano de Mossoró? E o desemprego crescente? Muitos outros problemas poderia ser acrescentados. Falta espaço. Bom, nesse banzé todo ressalte-se que o crescimento de Mossoró deve ser creditado mesmo àqueles empreendedores que nela têm gerado riquezas e oportunidades, sobretudo, à gente mossoroense. Voltaremos ao tema.

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