domingo, 8 de julho de 2012

Artigo de Paulo Afonso Linhares


A FORÇA DOS PARTIDOS

Paulo Afonso Linhares

É sempre a senzala vista sob a ótica da casa-grande. As elites brasileiras são marcadamente paternalistas e, como tal, sempre enxergam o povo como incapaz de tomar suas próprias decisões. A nossa intelligentsia continua a entender, por exemplo, que é necessário estabelecer uma forte tutela através do Poder Judiciário, com a imposição de marcos regulatórios rigorosos e abrangentes, para o processo eleitoral. Aos partidos políticos apenas cabe o cumprimento de um cipoal de normas que, grosso modo, tratam das candidaturas, da propaganda eleitoral e da movimentação financeira dos partidos e candidatos. Um aspecto interessante dessa questão é o grau cada em mais acentuado do uso de tecnologia informacional (TI) nesses processos, facilitadores de um controle tão rígido das atividades partidárias e eleitorais que tornam decerto bem mais distante o exercício pleno das práticas democráticas.
Noutras palavras, o arsenal jurídico-normativo posto à disposição da Justiça Eleitoral com o desiderato de coibir os vícios e abusos do poder político e econômico - que são atitudes ilegitimadoras da representação política resultante dos processos de eleição dos agentes políticos - tem genericamente alcançado seus objetivos, embora sem acarretar a evolução do sistema partidário. Aliás, a estrutura arcaica e a enorme pobreza dos partidos políticos brasileiros, o fazem absolutamente inadequados ao desempenho da imensas tarefas de que são portadores por definição constitucional e legal. Os partidos políticos, sobretudo seus órgãos locais (comissões municipais provisórias e diretórios municipais) e regionais (comissões estaduais provisórias e diretórios estaduais), de per si não têm qualquer condição de arcar com as enormes despesas das campanhas eleitorais que, no Brasil, ocorrem a cada dois anos.
O acentuado déficit democrático, que as instituições erigidas na Constituição de 1988 não conseguiram mitigar, deve ser imputado à fragilidade orgânica dos partidos políticos, que rigorosamente têm atuação quase sempre apenas nos períodos eleitorais e cada vez ficam mais distantes de serem os interlocutores da sociedade, papel que por excelência lhes é reservado em qualquer democracia que mereça esse nome. Afinal, não é o partido político o moderno príncipe na visão do filósofo Antonio Gramsci? Por que então, no Brasil, a sua atuação tem caráter  tão secundário e pouco decisivo dos processos políticos?  Ora, são os partidos políticos instituições de mediação entre a Sociedade e o Estado, formados por cidadãos organizados no dúplice desiderato de dar exequibilidade a um conjunto de propostas que encorpam um determinado projeto de sociedade - que constitui os chamados "programas partidários" - bem assim a difusão de ideais e valores que informam uma certa visão do mundo. Para realização destes objetivos, os partidos políticos estabelecem estruturas organizacionais cuja espinha dorsal é a militância (o conjunto de cidadãos eleitores filiados) e as instâncias diretivas. O poder de mobilização de um partido é diretamente proporcional ao de sua militância.
Ocorre que, na destinação natural da conquista e manutenção do poder pelos partidos políticos, não raro as lideranças situadas nas mais altas instâncias partidárias sobrelevam o jogo das alianças e o próprio desfrute do poder por uma nomenclatura de poucos privilegiados em detrimento da militância que, a partir de certo nível, deixa de se reconhecer como partícipe  da estrutura partidária,  passando a uma vida politicamente desorganizada enquanto cidadãos. Este fenômeno ocorre, presentemente, com o PT, em alguns Municípios brasileiros, nos quais o Diretório Nacional vem impondo posições políticas, em vista das eleições de 2012, ao arrepio das instâncias partidárias inferiores. Nisto, infelizmente, se igualou aos outros partidos; caiu na vala comum.
Embora o cidadão possa ter uma participação política através de instituições extrapartidárias, a existência de partidos bem estruturados e claramente definidos nos campos político e ideológico e condição sine uma non ao funcionamento regular do Estado Democrático de Direito. No Brasil, isto ainda é utopia, sobretudo, porque os poucos que acham possuir o monopólio do pensar, demorarão muito para compreender que a proteção que impõem ao povo, com suas leis cheias de afetação e bobagens, apenas reforçam o jugo da ignorância e da lassidão políticas. Afinal, a pedra angular da democracia é a noção basilar da igualdade entre cidadãos e a natural propensão de cada um para ser livre.

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