quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Artigo de José Rodrigues Filho, prof. da UFPB

Os Sistemas Judiciais e 
os Desafios de Mudanças

José Rodrigues Filho *

“Nós acadêmicos e estudiosos da administração pública e dos estudos
organizacionais devemos não só considerar como também homenagear a
Ministra Eliana Calmon como a mãe espiritual da administração judicial
deste país”.

Ao tratar dos problemas da administração da justiça nos Estados
Unidos, no inicio do século passado, William Willoughby, em sua obra
sobre administração judicial, expressou que não existe nenhuma razão
válida para que o trabalho judicial de um governo não deva ser
desempenhado com a mesma eficiência e economia do que é exigido nas
atividades administrativas e legislativas, mesmo reconhecendo que as
cortes são organizações complexas com suas peculiaridades.

No Brasil, como em vários países da velha Europa, as atividades do
judiciário são quase que desconhecidas, sobretudo do ponto de vista
administrativo. Pouco se conhece da aplicação dos estudos
organizacionais no âmbito dos sistemas judiciais. Portanto, durante as
últimas décadas o campo da administração pública, na maioria dos
países da Europa, negligenciou a administração das cortes ou das
instituições judiciais. A partir dos anos 90, diante da influencia da
Inglaterra, é que se começou um movimento de mudanças nos demais
países europeus, tendo em 1999 sido realizado uma conferencia sobre
administração e distribuição da justiça, com a participação de juízes,
acadêmicos e tomadores de decisões e com o objetivo de se desenvolver
uma perspectiva nas instituições judiciais, esquecida durante muitos
anos pela administração pública.

Por conta disto, a literatura tem comentado que muitas das
organizações judiciais negligenciam as modernas teorias das
organizações e adotam modelos organizacionais paramilitares, altamente
burocráticos, arcaicos e rígidos, ainda presas às visões tradicionais
de Taylor e Fayol.

No Brasil a situação é pior e são quase que desconhecidos os estudos
organizacionais nas instituições judiciais, ao contrário do que
acontece com outras organizações públicas e privadas. Os últimos
acontecimentos demonstraram que a questão não é só da administração
propriamente dita, diante das denúncias de corrupção e de que centenas
de servidores públicos do judiciário tinham recebido quantias
“atípicas”, além de comentários duros, chocantes e surpreendentes para
toda a sociedade brasileira, de que existe algo errado “escondido por
trás das togas”. Assim sendo, questões éticas começaram a ser expostas
no judiciário brasileiro.

Diante disto, tivemos um dos mais importantes acontecimentos dos
últimos séculos, neste país, nos últimos dias, envolvendo as
instituições judiciais e a administração pública, quando a maioria dos
ministros do Supremo Tribunal Federal votou pela transparência no
âmbito das instituições judiciais. Este fato abre um espaço para que
os estudos organizacionais sejam utilizados no âmbito das instituições
judiciais. Além disto, ficou demonstrado que a maioria dos juízes e
promotores de justiça brasileiros quer mudanças e lutar por uma melhor
distribuição da justiça.

Contudo, isto não aconteceu sem que alguém tivesse colocado a sua
própria vida a um sacrifício de proporções incalculáveis. No inicio do
século passado, Roscoe Pound lançou um manifesto nos Estados Unidos
perante a Ordem dos Advogados daquele país, intitulado “as causas da
insatisfação popular com a administração da justiça”, no momento em
que as cortes americanas eram consideradas como reinos feudais. A
partir daí houve um avanço na administração judicial americana para
combater as mazelas do sistema existente. Com isto, Roscoe Pound foi
considerado como sendo o pai espiritual da administração judicial nos
Estados Unidos.

Aqui no Brasil podemos dizer que a Ministra Eliana Calmon é a mãe
espiritual não só da administração judicial como também da
transparência, moralidade e ética. Sem a sua coragem e o seu
sacrifício, hoje não tínhamos nada a comemorar. Neste sentido, nós
acadêmicos e estudiosos da administração pública e dos estudos
organizacionais devemos não só considerar mas também homenagear a
Ministra Eliana Calmon como a mãe espiritual da administração judicial
deste país.
* Professor da Universidade Federal da Paraíba.
Foi pesquisador nas Universidades de Johns Hopkins e Harvard.
http://jrodriguesfilho.blogspot.com/

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