Apoiar
o desenvolvimento sustentável
de
Pernambuco não é investir em Suape
Heitor Scalambrini Costa
Professor da Universidade Federal de Pernambuco
A motivação em
escrever este artigo foi à propaganda institucional da CHESF-Companhia Hidro
Elétrica do Rio São Francisco publicada na mídia. É dito que a inauguração de
novas subestações e linhas de transmissão que atenderão o complexo industrial e
portuário de Suape, com investimentos de 200 milhões de reais, implica que
”apoiar o desenvolvimento de Pernambuco é investir em Suape”.
Aqui cabem alguns
comentários sobre esta afirmativa inserida em um contexto onde se evidencia o
crescimento econômico do Estado, e não seu desenvolvimento. O que se verifica
de fato é a desproporcional concentração e priorização de investimentos que
estão sendo realizados no território de Suape em detrimento de outras regiões
do Estado que conta com 185 municípios. Não é a intenção do autor questionar a
importância que esta empresa teve e tem para o Nordeste, mas sim criticá-la por
apoiar hoje um modelo de crescimento concentrador, excludente e predatório com
relação as pessoas e ao meio ambiente, fazendo renascer o velho jargão
utilizado na época da ditadura militar, onde se dizia que é necessário fazer “o
bolo crescer para depois dividi-lo”.
Um dos aspectos da
crítica ao modelo adotado baseia-se na concentração de investimentos em Suape.
Segundo dados oficiais, de 2007 a 2014 serão investidos no Complexo, mais de 60
bilhões de reais, com recursos públicos e privados. Montante que poderia ser
mais bem aplicado se distribuído em empreendimentos descentralizados, menores,
sustentáveis, atingindo um número maior de municípios.
Outro erro desta
proposta de crescimento econômico insustentável é o interesse de atrair e
incentivar que indústrias “sujas”, do século passado, com grande capacidade de
poluição (estaleiros, refinaria, petroquímicas, termoelétricas a combustíveis
fósseis, ...) se instalem em Suape. A concentração industrial utilizando
combustíveis fósseis e seus derivados, em um território de 13.500 ha, é o maior
dos erros, pois provocará graves agressões ambientais, poluindo a terra, a água
e o ar, além de afetar a saúde das pessoas com doenças características deste
ambiente, de muita liberação de gases tóxicos, e que também provocam o efeito
estufa, contribuindo assim para o aquecimento global.
Do ponto de vista da
empregabilidade o Complexo de Suape deixa muito a desejar. A qualidade dos
empregos oferecidos pelas indústrias ali estaladas exige uma capacitação
especializada que não foi planejada pelos gestores, implicando em uma
importação de mão de obra. Hoje o perfil do emprego é majoritariamente para
atender a construção civil, portanto de baixa qualidade e transitório.
Alem das questões
econômicas que utilizam conceitos e estratégias altamente discutíveis e
polêmicas, outro agravante constatado é relativo à questão social. O
tratamento dado aos moradores nativos agride os direitos humanos daqueles
cidadãos e cidadãs, visto a truculência de como tem ocorrido a reintegração de
posse. Famílias têm sido expulsas brutalmente sem que outro local seja
disponibilizado para irem morar, contribuindo para isso as “indenizações”
(quando pagas) irrisórias, o que não possibilita a aquisição de outra moradia.
A brutalidade contra estas famílias tem ocorrido sistematicamente desde 2007
com a aquiescência das autoridades. O caso mais recente da “selvageria” contra
estas populações ocorreu contra os moradores do Engenho Tiriri em 22/05/2012.
Experiências vividas
em outras partes do planeta mostraram que no entorno destes complexos
industriais, além da devastação do meio ambiente ocorre o aumento de doenças
nas populações que habitam no seu entorno. No Brasil um exemplo clássico foi o
ocorrido na cidade de Cubatão (58 km de SP) que ficou conhecida como a cidade
dos "bebês sem cérebro". De 1978 a 1984, foram registrados vários
nascimentos de crianças anencéfalas, e a relação causal foi quase imediata
devido às emissões de gases e resíduos industriais, como fator principal para o
crescimento de casos de anencefalia, além de outras doenças respiratórias
encontradas em maior escala na região. Também distritos industriais como o de
Duque de Caxias (RJ), Betim (MG), Porto de Aratu (BA), Pecém (CE), entre outros
podem servir de exemplos sobre a qualidade de vida dos seus habitantes.
O progresso desejado
não é fazer obras e privilegiar a parte econômica em detrimento de pessoas,
comunidades, ecossistemas, e do meio ambiente. Crescimento econômico não se
conjuga com desenvolvimento humano. Há que mudar o paradigma da voracidade do
lucro para o progresso humano, que implica na melhoria da qualidade de vida das
pessoas (educação, saúde, transporte, saneamento, moradia, segurança, lazer,
...). Enquanto isso não ocorrer o crescimento atual com o consumo desenfreado
torna as populações mais pobres, aumentando os custos mais rapidamente do que
os benefícios, além de cada vez mais destruir a natureza e a própria
humanidade. As crises que o mundo atravessa neste inicio do século 21, em
particular a econômico-financeira e ambiental, mostram claramente o esgotamento
de um modelo promovido pela civilização industrial, e daí urge promover outros
valores para o bem estar.
Exemplos são muitos,
e devemos tomar como exemplo o já acontecido no país e no exterior, para poder
afirmar que os chamados ”benefícios” hoje trazidos pelo Complexo Industrial
Portuário de Suape, serão a médio e longo prazo pagos com o sacrifício e a
deterioração da qualidade de vida da população pernambucana, que está perdendo
a oportunidade de um desenvolvimento sustentável e para todos.
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