sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

Resumo completo da pregação em que o Papa cita o católico fingido e o ateu

2017-02-23 
L’Osservatore Romano

O «escândalo» de quem se professa cristão e depois mostra o seu verdadeiro rosto com uma vida que de cristã nada tem; e o contratestemunho de quem «explora» e «destrói» as vidas dos outros fingindo que é um bom católico. Sobre isto centrou-se a missa celebrada na manhã de quinta-feira 23 de fevereiro em Santa Marta pelo Papa Francisco o qual, comentando as palavras severas usadas por Jesus no Evangelho, chamou à conversão os protagonistas de certas «vidas duplas».

A homilia do Pontífice partiu do salmo 1, no qual se lê: «Bem-aventurado o homem que não anda segundo o conselho dos ímpios, nem se detém no caminho dos pecadores, nem se assenta na roda dos escarnecedores. Antes tem o seu prazer na lei do Senhor, e na sua lei medita de dia e de noite». A Escritura, explicou Francisco, refere-se ao homem que tem «a sua força» no Senhor, «que se sente pequenino, que sabe que sem o Senhor nada pode fazer». Ele «é bem-aventurado no Senhor».

Mais adiante, acrescentou, o salmo propõe também a «contraposição entre os que seguem a lei do Senhor e os arrogantes, malvados». É a mesma contraposição que se encontra no evangelho do dia (Mc 9, 41-50). Também naquele trecho «há os bons e os maus». Por detrás das palavras de Jesus percebe-se «a figura destes justos que se sentem pequeninos, mas a sua confiança está no Senhor». Um trecho, observou o Papa, no qual «por quatro vezes» se repete a palavra «escândalo». E ao usá-la o Senhor «foi muito severo», a ponto de dizer: «Ai de quem escandalizar um só destes pequeninos. Ai!». Com efeito, explicou o Pontífice, «o escândalo, para o Senhor, é destruição». E Jesus aconselha: «É melhor que se destrua a si mesmo do que os outros. Corta a tua mão, o pé, arranca um olho, lança-te ao mar. Mas não escandalizes os pequeninos, ou seja, os justos, aqueles que confiam no Senhor, que simplesmente acreditam no Senhor».

A este ponto o Pontífice questionou-se: «Mas o que é o escândalo?». A resposta diz respeito à vida concreta de cada pessoa: «O escândalo é dizer uma coisa e fazer outra; é a vida dupla». Um exemplo? «Eu sou muito católico, vou sempre à missa, pertenço a esta associação e àquela; mas a minha vida não é cristã, não pago o justo aos meus empregados, exploro as pessoas, faço negócios sujos, lavagem de dinheiro». Esta é uma «vida dupla». Infelizmente, considerou o Papa, «muitos católicos são assim e escandalizam».

Palavras claras que reconduzem todos à vida de cada dia: «Quantas vezes ouvimos no bairro ou noutras partes: “Mas ser católico como aquele, é melhor ser ateu”. Eis o escândalo», que «destrói», que «desmoraliza». E «isto acontece todos os dias: é suficiente ver o telejornal ou ler os jornais. Nos jornais há tantos escândalos, e há também a grande publicidade dos escândalos. E com os escândalos destrói-se».

Para explicar ulteriormente as suas palavras, o Pontífice contou um facto recente relativo a «uma empresa importante» que estava «à beira da falência». Dado que, disse, as autoridades «queriam evitar uma greve justa, mas que não teria sido boa», procuraram entrar em contacto com o responsável da empresa. E onde estava ele enquanto «a empresa estava a falir» e as pessoas «não recebiam o ordenado do próprio trabalho»? Este dirigente, que dizia ser «um homem católico, muito católico», estava «numa praia do Médio Oriente» a passar «as férias invernais». O episódio «não foi publicado nos jornais», mas «as pessoas souberam-no». Estes «são os escândalos, a vida dupla». E Jesus diz a quem se comporta assim: «A estes pequeninos, a estes pobres que creem em mim, não os arruínes com a tua vida dupla».

Parafraseando outro trecho do evangelho, o Pontífice imaginou o momento no qual quem dá escândalo se apresenta à porta do Céu: «Sou eu, Senhor!» – «Mas como, não te recordas? Eu ia à missa, estava ao teu lado, pertencia a esta associação, faço isto... não te recordas de todas as ofertas que dei?» – a«Sim, recordo. As ofertas, recordo-me delas: todas sujas. Todas roubadas aos pobres. Não te conheço».

O problema, explicou o Papa, nasce de uma atitude que está bem descrita precisamente na primeira leitura do dia (Eclo 5, 1-10): «Não confies nas tuas riquezas, e não digas “não preciso de ninguém”». E ainda: «Não sigas o teu instinto nem a tua força, satisfazendo as paixões do teu coração». Isto é, a vida dupla «vem do seguir as paixões do coração, os pecados capitais que são as feridas do pecado original». Quem dá escândalo, disse Francisco, segue estas mesmo se as esconde. A Escritura admoesta estas pessoas que, mesmo reconhecendo o seu erro, contam com o facto de que «o Senhor é paciente, se esquecerá...». E convida todos a «não adiar a conversão».

Um convite reafirmado pelo Pontífice a cada cristão: «A cada um de nós fará bem, hoje, pensar se há algo de dupla vida em nós, de parecer justos, de parecer bons crentes, bons católicos, mas por detrás fazer outra coisa». Trata-se de compreender se a atitude é a de quem diz: «Mas sim, o Senhor perdoar-me-á tudo, mas eu continuo...» e, apesar de estar ciente dos próprios erros, repete: «Sim, isto não está bem, converter-me-ei, mas não hoje: amanhã». Um exame de consciência que deve levar à conversão do coração, a partir da consciência de que «o escândalo destrói».

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