Os atingidos pelo Complexo de Suape
Heitor Scalambrini Costa
Professor da Universidade Federal de Pernambuco
Em Pernambuco
vivencia-se uma situação, análoga a tantas outras que ocorrem no País e diz
respeito ao modelo predatório adotado de desenvolvimento. Quem paga pelo
“progresso” a nível local são as populações nativas, obrigadas a saírem de suas
moradias, criando grandes problemas sociais. E também o meio ambiente, onde são
despejados produtos tóxicos e suprimida a vegetação, com reflexos na vida
animal, nos rios e riachos. Esta ação local acaba se somando negativamente a
tantas outras que estão sendo realizadas em todo o território nacional, e em
todo o planeta.
Constata-se que a sociedade deixou-se hipnotizar pelo crescimento
econômico a todo custo (expresso em maiores valores monetário do PIB, que não
leva em conta os custos ambientais). E o que se verifica é um conflito entre o
interesse econômico predominante e o interesse coletivo da população, do meio
ambiente com seus ecossistemas, enfim, de todas as manifestações no plano da
vida. Neste embate, sem a participação da sociedade, o dinheiro tem vencido inexoravelmente.
Com a megalomania das obras do Complexo Industrial e Portuário de
Suape são evidentes os efeitos de um crescimento desordenado, de reflexos
destrutivos sérios, afetando principalmente as populações nativas,
agricultores, que acabam sendo inteiramente ignorados, tornando invisíveis aos
olhos da sociedade. Sobretudo pelo papel da propaganda oficial, que apenas
destaca as virtudes econômicas dos projetos.
Os moradores do entorno acumulam reclamações contra a Autoridade
do Porto de Suape, e são testemunhas de um processo que tem gerado pobreza e
desolação. São relatadas promessas não cumpridas,
manipulação e pressão sobre os moradores da área constituída
de 22 engenhos (13.500 ha
e aproximadamente 15.000 famílias) onde situa-se o Complexo, a falta
de informação, intransigência nas negociações e intolerância ao lidar com
a população.
A desocupação deste território pelo Estado tem ocorrido de forma
truculenta, sem negociação “amigável” com os moradores. Muitas vezes,
recorrendo, ao que se denomina na região de “milícias armadas” para a execução
dos processos de reintegração de posse contra os pequenos produtores rurais. É
uma farsa a chamada “negociação” para definir a indenização a ser paga e
acertos nos detalhes da saída dos moradores. Denúncias e mais denúncias são
constantes, algumas divulgadas pela mídia, mas nada é feito. Sem dúvida, um dos
motivos destas expulsões arbitrárias está na sobrevalorização, na especulação
do preço da terra, que é muito disputada por grupos empresariais.
O processo de “desapropriação”, tem se caracterizado por
expropriação e esbulho, com a Constituição Estadual e com o Marco de Reassentamento
Involuntário-MRI do Projeto Pernambuco Rural Sustentável-PRS (disponível em http://www.prorural.pe.gov.br/arquivos/marco_reassentamento.pdf), cujo objetivo é o tratamento das questões que envolvem
a mudança ou perda involuntária do local de moradia, a perda de renda ou meios
de subsistência, em decorrência da implementação de projetos.
Artigos
da Lei Magna e as diretrizes do MRI/PRS estão sendo violados, social e
ambientalmente. Por exemplo, o artigo constitucional 139 que diz que o
Estado e os municípios devem promover o desenvolvimento econômico,
conciliando a liberdade de iniciativa com os princípios superiores da justiçasocial, com a finalidade de
assegurar a elevação do nível de vida e bem-estar da população. Também o artigo
210 que trata da proteção ao meio ambiente é desrespeitado, assim como o artigo
211 que veda
ao Estado, na forma da lei, conceder qualquer benefício, incentivos fiscais ou
creditícios, às pessoas físicas ou jurídicas que, com suas atividades poluam o meio ambiente.
Os agricultores despejados, não têm noção de onde irão
restabelecer seu sistema produtivo garantindo sua qualidade de vida. Pelo
contrário, estão perdendo o gosto pela vida, sendo constrangidos com a ação da
polícia, homens armados que os fazem sentir verdadeiros bandidos. Além das condições de vida digna estão retirando desses
agricultores, sua condição de existência e outros bens que são de ordem
imaterial. E mesmo
aqueles que se aventurarem morar nas cidades, não poderão adquirir nenhum
imóvel com as irrisórias indenizações pagas por Suape.
Portanto, é urgente antes que o “caldeirão social” exploda, um
novo formato do processo negocial, a revisão das indenizações, a retirada das
milícias armadas, a regularização fundiária destes moradores e a implementação
imediata do projeto Morador (Lei 13.175 de 27 de dezembro de 2006) que garante
o direito a políticas públicas para os agricultores que vivem no entorno de
Suape.
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