sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

Artigo de Paulo Afonso Linhares

O ENFADO DAS 
MORTES ANUNCIADAS

Paulo Afonso Linhares


Nada mais enfadonho que a linearidade das coisas, a mesmice mortalmente previsível, as bobagens do politicamente correto, a cega crença em valores que nada valem, como é o caso da justiça que, na  certeira concepção do filósofo Nietzsche, é apenas uma concessão de quem detém efetivamente o poder. Como um ser-em-si a justiça não existe. Justiça, não deixa de ser aquela  ilusão de equidade, categoria conceitualmente indefinida que não raro se converte na vontade política de uma elite perversa e não menos grotesca que impõe à sociedade o seu modo de existir-no-mundo. É no poço da equidade que os juízes ‘encontram’ as razões de decidir que até podem transcendem o direito posto - a lei, a jurisprudência, os uso e costumes - para formar seu livre convencimento na apreciação das provas, mesmo quando estas não existem.
Lamentável que o “povo do PT”, além de outros equívocos, acreditava que a fronte áurea e o argênteo peitoral da deusa Themis reluziriam a verdade no julgamento da apelação do ex-presidente Lula pela 8ª Turma do TRF4, ocorrido em 24 de janeiro de 2018. Mortal engano. Enquanto o fatigada divindade se consumia nalgum bordel do Olimpo, de Paris, Hong Kong, Miami ou de Istambul, esses meninos traquinos, pomposamente denominados ‘desembargadores federais’, em seu nome, solenes e circunspectos, envergaram mortalmente o direito, enxovalharam a Constituição do Brasil, para impor terríveis castigos a esse retirante nordestino que um dia ousou, como um Prometeu caboclo, inverter a equação dos senhores da Casa-Grande. Querem devorar o seu fígado, sentença a sentença. Outros processos, igualmente aleijões jurídico-processuais, estão nas retortas do Califado de Curitiba e desaguarão na mesma vala comum do caso recentemente julgado em Porto Alegre. Resultados previsíveis.
Longas e não menos enfadonhas preleções destituída de juridicidade e da lógica mais elementar, tornadas mais bizarras e desconexas à medida em que escorregavam das bocas togadas desses meninos-juízes-poderosos do Tribunal Regional Federal da Quarta Região. Mentiras ganharam foros de incontestáveis verdades; provas que eram meros simulacros de verdade passará à condição de absolutas certezas. Sim, esse sonhador e não menos ingênuo retirante nordestino que lutou para resgatar da miséria mais de trinta milhões de brasileiros deveria pagar por tamanha ousadia. Ora, não deveriam ele e seus ‘protegidos’ esperar que o Mercado-deus lhes absolvesse, sobretudo ele, o Lula que tantas concessão fez aos poderosos da “livre iniciativa”? Adjuva nos et redime nos! 
Coisa nenhuma! A chibata da lei tergiversante deve vergastar impiedosamente o lombo de Lula até que ele se lembre de onde veio e para onde jamais poderia ter ido. A retórica  implacável do meninos-togados da 8ª Turma do TRF-5 vai jogá-lo naquele círculo do inferno destinado aos ingênuos, que o poeta Dante sequer ousou descrever. E espicharam uma pena que já era ridícula em nove para pesados doze anos, para gáudio da Rede Globo e congêneres do baronato midiático, dos conservadores e idiotas de todos os matizes. Lula na cadeia tudo se resolve? Parece que sim, pelo que se vê dessa confusão de vozes que grassa no terreno pantanoso das redes sociais.
Certo é que essas coisas anunciadas, como foi a manutenção da sentença  do califa Sérgio Moro pelos juízes da 8ª Turma do TRF4, no julgamento da apelação do ex-presidente Lula, ocorrido em 24 de janeiro de 2018, não deixam de ser enfadonhas: de um ou de outro lado, todos sabiam que ‘ferrar’ uma possível candidatura presidencial do líder petista começaria com a sua condenação por um órgão colegiado de segunda instância, nos marcos da Lei da Ficha Limpa que, aliás, recebeu a sanção de Lula, à época poderoso inquilino do Palácio do Planalto. Ele foi na onda do politicamente correto e ajudou trazer a lume uma lei que atropelou importantes direitos fundamentais, como a presunção da inocência que proíbe a prisão antes de esgotados todos os recursos processuais. Enfim, Lula fez o laço que agora querem apertar no seu pescoço.
A sentença de primeiro grau não apenas foi mantida, como ampliado o período de prisão de Lula, de nove para doze anos, em regime fechado. De um lado, pessoas indignadas com essa pouco compreensível livre convicção que ronda as cabeças dos empoderados juízes deste país e que constitui num álibi perfeito para todas as teratologia que possam parir enquanto privilegiados intérpretes e aplicadores das leis segundo suas próprias convicções. Do outro, aqueles que,  por múltiplas razões, querem ver esse cabeça-chata nordestino a espiar o grave pecado de ter sonhado com um Brasil para todos, sem miséria e com cidadania. Infelizmente, para conseguir essas coisas, ele se juntou com quem não devia. Lula e seu partido pagarão um alto preço pelas alianças espúrias que fizeram com conservadores e corruptos de todas extrações, para garantir o acesso ao poder e a governabilidade.
O artifício jurídico de impedir a candidatura de Lula não encerra a questão nem evita que o seu nome continue na ponta das pesquisas eleitorais, algo que se ampliará com sua quase certa prisão. Fato é que, onde quer que ele esteja terá peso na eleição presidencial deste 2018: o seu apoio poderá eleger o próximo presidente da República. Isto nenhum tribunal poderá impedir. No mais, é torcer para que as forças vivas desta nação tupiniquim possam acertar um projeto comum que fortaleça as conquistas políticas e materiais da sociedade brasileira. Já é tempo.

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