domingo, 3 de março de 2013

Artigo de Paulo Afonso Linhares


EVITÁVEL TRAGÉDIA SEVERINA

Paulo Afonso Linhares

Há mais de um século se construiu um postulado de que as estiagens no semi-árido do nordeste brasileiro são inevitáveis, como fenômeno natural, porém, os seus indesejáveis efeitos - aqueles que dificultam a fixação do homem à terra como o déficit hídrico, as restrições para desenvolvimento das atividades agrícolas e pecuárias etc. - são equacionáveis mediante inúmeros recursos tecnológicos específicos que transformam as secas, em muitos casos, em fator positivo e possibilitam a convivência da população nordestina com o meio ambiente árido. 

A recente explosão da fruticultura irrigada no Rio Grande do Norte, no Ceará e, sobretudo, no Vale do São Francisco pernambucano é uma flagrante demonstração desse enorme potencial da região. À guisa de exemplo, o Chile produziu no ano 2012 quase dois bilhões de dólares em frutas em 200 mil hectares irrigados. Ora, somente a microrregião polarizada pelo Município de Petrolina, Pernambuco, tem possibilidade de utilizar 1 milhão de hectares irrigados com diversas culturas - equivalente a cinco Chiles - pois dispõe de abundantes recursos hídricos, de excelentes solos e de  com 3 mil horas de intensa insolação por ano, tudo possibilitando que até três colheitas anuais. Aliás, as nobres castas de uvas exploradas ali tem produzido excelentes vinhos, o mesmo que poderá ocorrer brevemente na microrregião serrana em torno do Município de São Miguel, onde vem estabelecendo-se um pólo vinícola. Enfim, multifacetados e inúmeros são os exemplos de como  a intermediação de tecnologias torna possível a convivência com as secas.

Quase todos os elementos que possibilitam essa harmoniosa convivência estão presentes, à exceção de um que é imprescindível: a vontade política para conjugar esses fatores a partir de políticas públicas estruturantes e mesmo de programas emergenciais. Veja-se a atual situação de amplas faixas da região nordestina que, em razão da estiagem que se prolonga desde 2010, vem dizimando os rebanhos bovinos e impondo precarização enorme à vida das populações sertanejas. Reconheça-se que se não existisse um programa de redistribuição de renda como o Bolsa-Família, do governo federal, muitas pessoas já teriam perecido severinamente. No entanto, o mesmo governo federal - pelo fato de concentrar enorme volume de recursos financeiros - deveria ter deflagrado alguns programas emergenciais para salvar os rebanhos nordestinos atingidos pela atual estiagem, sejam ações assistenciais ou mediante financiamento com juros subsidiados, com recursos do Fundo Constitucional de Financiamento do Nordeste - FNE que, segundo relatório atinente o exercício 2012, divulgado pelo seu gestor (Banco do Nordeste do Brasil), detém um patrimônio líquido que supera os 40 bilhões de reais (R$ 42.848.162.000,00). Somente as transferências de recursos da União chegara, em 2012, a mais de 5 bilhões de reais (R$ 5.186.981.000,00).

Com efeito, algumas ações anteriores como as linhas de crédito  Pronaf – Linha Especial Seca 2012 e Pronaf B – Linha Especial Seca 2012, do BNB, são extremamente tímidas para o enfrentamento da gravíssima situação atual. As ações devem ser concretas e imediatas, sem o rosário de dificuldades da burocracia de Brasília. Uma destas, por exemplo, seria a possibilidade de o governo federal comprar no mercado interno ou até importar rações para salvar da dizimação os rebanhos das regiões atingidas, a serem distribuídas mediante critérios rigorosos aptos a evitar os velhos vícios de sempre. Com apenas 10% das transferências do FNE para 2013 - mais de meio bilhão de reais! - muito poderia ser feito para minorar essa tragédia que poderia ser evitada. Com a palavra a operosa presidente Dilma, que jamais deverá esquecer a aclamação que recebeu do povo nordestino, nas urnas.   

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