CONSTITUIÇÃO CIDADÃ: 25 ANOS DEPOIS
Paulo Afonso Linhares
Despertava o Brasil de um pesadelo de
mais de duas décadas
de regime autoritário,
de supressão
das liberdades civis e políticas,
quando veio a lume a Constituição
Federal de 5 de outubro de 1988, estatuto político e jurídico representativo da correlação das forças que participaram do embate renhido
que teve como palco a Assembleia Constituinte instalada em 1° de fevereiro de 1987.
De princípio um grave vício de origem: não se tratava de uma constituinte
exclusiva, isto é,
uma assembleia formada por representantes eleitos cuja finalidade precípua seria a de elaborar a nova
Constituição,
mas, de um Congresso Constituinte, isto é,
os 559 deputados federais e senadores, eleitos em novembro de 1986, acumulariam
as funções
de congressistas e de constituintes; findos os trabalhos da Constituinte,
continuariam a atuar no parlamento bicameral ordinário. Essa grave circunstância, todavia, foi minimizada pelo alargamento da participação dos diversos segmentos sociais em várias fases do processo, a partir da
aprovação
de um regimento interno ampliativo da iniciativas populares.
A verdade é que, graças à atuação de lideranças do porte de Ulysses Guimarães, o presidente da Assembleia
Constituinte, o processo que teve uma origem espúria (um Congresso ordinário transformado em Constituinte) e
com enorme déficit
de legitimidade, adquiriu enorme representatividade social e política nos tensos vinte meses que se
seguiram. E foi tal que, solenemente promulgada em 5 de outubro de 1988, a nova
Constituição
revestia-se de inegável
legitimidade.
A despeito das tantas objeções levantadas contra a nova lei
fundamental e suprema do Brasil, o parâmetro
maior de validade a todas as demais espécies
normativas, ademais de ser a chave de abóbada
do ordenamento jurídico,
como de ser muito detalhista e de albergar matérias que deveriam ser próprias de espécies normativas infra
constitucionais, fato é
que a Constituição
de 1988 nasceu como uma das mais avançadas
das últimas
cinco décadas,
a começar
pela definição
de uma pauta de direitos fundamentais antes mesmo das disposicões que cuidam da organização do Estado.
Embora auto aplicáveis suas disposições, a Carta de 1988 necessitava da
regulamentação
de quase trezentas normas infra constitucionais, muitas das quais ainda estão pendentes após passado um quarto de século de omissões do Congresso Nacional, a começar pelo aborto que se tornou o
processo revisional previsto no artigo 3°
do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias
("A revisão
constitucional será
realizada após
cinco anos, contados da promulgação
da Constituição,
pelo voto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional, em sessão unicameral"), quando
importantes reformas, sobretudo, a reforma política, deixaram de ser feitas. Apesar
das 6 emendas de revisão
e de outras 72 emendas constitucionais, a Constituição de 1988 carece de muitos ajustes
para adaptá-la
às
novas demandas sociais, econômicas,
políticas
e ambientais.
Se a promulgação da Constituição de 1988 representou o ápice do processo de ascensão dos direitos fundamentais no Brasil, o momento atual,
vinte e cinco anos depois, é
mercado por uma tendência
de acentuada precarização
desse elenco de direitos de berço
constitucional, inclusive a partir da atuação
de um Poder Judiciário
cada fez mais dominado pelo ativismo judicial e da omissão constante do Congresso Nacional,
que sistematicamente deixa de produzir marcos regulatórios em diversos domínios, isto sem falar num Poder
Executivo hipertrofiado e imperial. Enfim, Poderes desarmônicos de um Estado federal marcado
por crescentes desigualdades sociais e regionais, no que resulta quase nada a
comemorar nestas bodas de prata da vigente Constituição.
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