JUSTIÇA
E BOM SENSO
Paulo Afonso Linhares
O açodamento do ministro Joaquim Barbosa,
presidente do Supremo Tribunal Federal e relator da Ação Penal nº
470, o já célebre
"processo do Mensalão",
fez antecipar o desfecho dessa novela bufa que já se arrasta por muitos meses. Tudo para
satisfazer a tão temida "opinião pública" sequiosa de punições severas para aqueles, sobretudo os
dirigentes petistas, que teriam resvalado no lodaçal da corrupção. Claro, essa "opinião
pública"
alimentada com informações
tendenciosas acerca de um processo por todos desconhecido, sobretudo, a
fragilidade das provas que embasaram as condenações de alguns réus, como é
o caso do ex-ministro-chefe da Casa
Civil da presidência
da República,
José Dirceu.
Ora, mais do que todos, sabem os barões das grande corporações midiáticas que uma mentira dita mil vezes a
verdade parece. E perece! Já dizia
o astuto Paul Joseph Goebbels, marqueteiro oficial de Adolf Hitler. Assim, o
STF passou a ser a ponta da lança
a fustigar todos aqueles que, com ou sem razão, foram enredados no "processo
do Mensalão",
cujo propósito
verdadeiro seria transformar-se na nova "República do Galeão" para forçar
o então
presidente Lula a "getuliar", saindo da vida para entrar, também, na História. Pegar o "sapo barbudo",
todavia, mostrou-se uma tarefa ingente e não
menos desgastante: a elite conservadora e sua imprensa poderosa vendeu a imagem
de um Lula beberrão
e manietado por uma camarilha de "auxiliares", comandada por Dirceu,
que foram alvejados um a um (Dirceu,
Palocci, Genuíno,
Gushiken...), porém,
a surpresa foi o crescente fortalecimento de Lula que, aliás,
botou a canalha toda no bolso e até conseguiu
eleger brilhantemente sua sucessora na Presidência da República. Isto sem falar que várias vezes quiseram inclui-lo na mesma
Ação
Penal 470, sem êxito.
O jeito era mesmo se contentar com a
degola moral de alguns dos seus mais próximos
auxiliares. Foi aí que
Dirceu - que sempre cultivou péssimas
relações
com os aliados petistas no Congresso e
na dita "grande imprensa" - entrou nesse credo a força e por força de uma mirabolante releitura da
"Teoria do Domínio
do Fato", embora desautorizada pelo Prof. Dr. Claus Roxin,
renomado jurista alemão e um dos
maiores defensores dessa teoria criada por Hans Welzel, para julgar os crimes cometidos pelos
nazistas. Traduzida na
tosca visão
adotada pelo STF, ela quer dizer mais ou menos que não importa se Dirceu teria diretamente
portado as condutas ilícitas
que lhes foram imputadas na tonitruante denúncia do Procurador-Geral da República;
sua responsabilidade estaria fixada tão
somente pelo dever que teria, em razão
do cargo, de ter conhecimento de que o Governo a que servia mantinha regular
distribuição
de dinheiro a congressistas aliados, para manter folgada maioria em ambas Casas
do parlamento nacional. Aliás,
entrevistado pela imprensa brasileira, O Prof. Roxin afirmou que essa posição nada teria a ver com formulações teóricas de Welzel e sistematizadas por
ele próprio.
Claro, não é propósito destas linhas domingueiras discutir
tão
complexa teoria jurídica,
mas, apenas noticiar a sua perversão
- reconhecida claramente por Roxin - para dar esteio às condenações criminais imbuídas de propósitos políticos. E foi, inegavelmente. Agora,
"todo mundo tá feliz,
tá feliz",
como diz a edificante canção de Xuxa, já
que Dirceu e Genoíno foram para o complexo penitenciário da Papuda, em regime semi-aberto.
Entretanto, decerto para maior indignação
dos barões
das mídias,
Genoíno
foi mandado cumprir sua pena em prisão
domiciliar, por motivo de saúde,
e José Dirceu
conseguiu um bom emprego num hotel de Brasília
e passará,
lépido
e fagueiro, seus dias fora da prisão.
E não
era bem isso que os inimigos do PT queriam, para os quais, lembrando mais uma
vez as palavras do poeta Horácio,
a montanha depois de tanto rugir conseguiu apenas parir um ridículo rato. E uma dura lição: a preocupante precarização dos direitos fundamentais relativos à
liberdade, sobretudo, tocante às garantias constitucionais do
processo, levada a efeito pelo STF no julgamento do processo do Mensalão. Agora é
torcer para que esse precedente
judicial possa esvair-se em si mesmo, em favor do bom senso e da segurança jurídica.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Comentários críticos sem identificação não serão aceitos.