domingo, 24 de maio de 2015

Artigo de Paulo Afonso Linhares

PARA "COZINHAR O GALO"

Paulo Afonso Linhares

A intuição diz que a tão propalada reforma política não acontecerá no corrente ano civil, sobretudo, com tempo suficiente para ser aplicada às eleições municipais de 2016, em face da aplicação do princípio da anualidade ou, como querem outros, da anterioridade eleitoral, descrito no artigo 16, da Constituição Federal ("A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência."), cujo desiderato é preservar a higidez do processo eleitoral, porquanto as leis que venham a modificar essas regras do jogo eleitoral, a despeito de entrarem em vigor de imediato, somente podem ter aplicação às eleições que venham ocorrer pelo menos um ano depois, o que funciona como forte antídoto à tradicional mania brasileira dos casuísmos em matéria eleitoral, muitos dos quais prefigurados nas próprias resoluções do Tribunal Superior Eleitoral. Aliás, esse princípio é tão forte que sequer é suscetível de modificação através de emenda constitucional, uma vez que o Supremo Tribunal Federal até já firmou entendimento que ele é uma cláusula pétrea e, como tal, goza de imutabilidade.   

Claro, a chamada "classe política" não tem interesse na realização de mudanças de fundo nos sistemas eleitoral e partidário do Brasil, pois, é visível o temor por parte dos atuais detentores de mandatos que possam perder espaços políticos. Assim, com todos os defeitos, imperfeições e teratologias, melhor para a maioria dos congressistas (deputados federais e senadores) é a manutenção do status quo ante, embora algumas mudanças meramente cosméticas e pouco impactantes possam ser realizadas com vistas às eleições de 2016. É a velha e maçante história do mudar, porém, para tudo se manter como está, um dos corifeus do conservadorismo político de qualquer extração ideológica.

Assim, o anseio da comunidade nacional por mudanças nos sistemas eleitoral e partidário deve ser aplacado com respostas pontuais que contemplem àquelas (poucas) questões tidas como consensuais, a exemplo do fim das coligações partidárias nas eleições proporcionais, aberração que jamais deveria ter existido. Sim, perder alguns anéis para manter os dedos, deve ser o pensamento dos donos do poder. E como fica a questão crucial do financiamento de campanhas eleitorais e atividades partidárias? Não fica nem sai ou muda, apesar dos problemas que faz aflorar, conforme perceptível nos casos atuais do pagamento de propinas milionárias a executivos da Petrobrás que funcionavam como operadores dos partidos e lideranças políticas que os indicaram para os cargos de alto escalão da estatal. Estarrecida a nação brasileira assiste o desfiar desses novelos de ladroagem que estão na base da estrutura do financiamento de partidos políticos e campanhas eleitorais.


Cada vez o prazo para realização do essencial da reforma política fica mais exíguo. Lideranças políticas com assentos nas casas do Congresso Nacional preferem "cozinhar o galo" e apelar para evasivas ou manobras diversionistas, isto quando não sacam do bolso do colete alguma sandice cretina, a exemplo da proposta de ampliação dos atuais mandatos de prefeitos e vereadores, deputados e senadores, para unificar as eleições. Ora, é imperiosa essa unificação, contudo, sem a mínima possibilidade de  extensão de mandatos. Aliás, é fato que na ditadura militar (1964-1985) ocorreu aberração desse jaez, algo impensável no Estado Democrático de Direito. A técnica - efetivamente coisa séria - para unificar as eleições no Brasil, neste momento, seria a realização do próximo pleito municipal (prefeitos e vereadores) para um mandato tampão de dois anos em 2016 e eleições gerais em 2018. O resto é conversa fiada desses espertalhões que apostam na (apenas suposta) ingenuidade do povo e, no máximo, conseguem mesmo é abusar da paciência  de cada cidadão-eleitor deste país. Quo usque tendem?

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