domingo, 17 de abril de 2011

Artigo de Paulo Afonso Linhares

O CANSAÇO DOS RÓTULOS

Paulo Afonso Linhares



      No Brasil, atualmente, cada partido político é apenas uma sigla a compor uma grande sopa de letrinhas indecifráveis em seu duplo significado político e ideológico. Nesse caldeirão revolto decerto que bóiam três, ou talvez uma meia dúzia – e nem mais um prego! – de instituições partidárias que têm vida orgânica trans-eleitoral, i.e., que funcionam permanentemente como estuários da atividade militante de seus filiados; ao revés, a maioria dos partidos somente aparece nos períodos eleitorais e mesmo assim como meros balcões para abrigar interesses de pessoas ou grupos que os utilizam como instrumentos para empalmar poder político ou, no mínimo, fazer algumas barganha com quem conquistou e desfruta de suas benesses. Nesse sentido, permite-se dizer que há os partidos orgânicos, de atividade perene, e os partidos inorgânicos (formais ou meramente cartoriais), que cumprem apenas aquilo que se considera como mera feição legal, em inteiro detrimento da vital importância política que poderia ter a sua atuação como vetor das expectativas, interesses e mesmo sonhos de segmentos da sociedade.
      Embora os partidos orgânicos se situem mais à esquerda do espectro político, a verdade é que a experiência partidária brasileira mostra haver partidos progressistas que vivem, também, históricos dramas de afirmação. Claro, a inorganicidade é mais típica dos partidos de cariz mais conservador. O mais grave mesmo tocante aos partidos políticos, no Brasil, é o descaso como são tratados, sobretudo, por serem instituições essenciais ao Estado Democrático de Direito, contudo, sem nenhuma tradição de controle direto da máquina estatal. É um absurdo que a maioria dos partidos políticos, entre nós, estejam dissociados dos projetos de poder engendrados por grupos. No mundo civilizado, em que a estrutura do partido político é bem mais avançada que a nossa, são eles que formulam as grandes linhas das políticas públicas que, quando no governo, se transformam em ações concretas.
      A tradição sempre se mostrou muito forte na vida partidária, tornando os partidos estruturas pouco mutáveis, personalizáveis, fragilizadas administrativa e financeiramente. Alguns partidos, na tentativa de manter um perfil amigável perante o eleitorado, utilizam recursos de marketing para contínuas reciclagens, a exemplo daquele que atende, atualmente, pelo nome de “Democratas”, que já foi PFL, PDS, ARENA, UDN... etc., cujo DNA, visto na ótica de uma pesquisa histórica cuidadosa, passa pela ditadura getuliana do Estado Novo, entra na Velha República, é Partido Conservador no Império tupiniquim (1824-1889), vai como elite dominante do Brasil colonial, sobe nas caravelas cabralinas num retorno à pátria-mãe portuguesa, onde manda e demanda muito antes daquele longínquo ano  de 1143, quando D. Afonso Henriques, pelo Tratado de Samora (celebrado com  o Rei de León y Castilla, Afonso VII), transforma o Condado Portucalense em Reino de Portugal e ele, Afonso I, torna-se o primeiro rei lusitano. Aliás, esse rapaz não era lá esse filé: para tornar-se senhor do Condado Portucalense derrotou as tropas da própria mãe, D. Tereza, na Batalha de São Mamede, no ano de 1128! Ferrou a própria mãe, imagine o que não deve ter feito às mães de outros... É daí a origem dos “demos”, de alguns peemedebistas, “republicanos”, petebistas, banqueiros da FEBRABAN, usineiros, ruralistas, religiosos tradicionalistas etc., enfim, reacionários e conservadores de todas as extrações, cores e formas que, infelizmente, são ainda as forças dominantes desta nação.
      Agora, feito de uma costela do DEM, sob a batuta do prefeito Gilberto Kassab, de São Paulo, surge o Partido Social Democrático - PSD, com a pretensão de ser um estuário neoconservador que albergue a potência do agronegócio e dos setores industriais e de serviços mais avançado. Quer, assim, reconquistar esses setores que, à míngua de melhor opção no campo conservador, preferiu “fechar” com o projeto de poder da esquerda, à frente o ex-presidente Lula, a atual presidenta Dilma e o seu PT. Fechou e se deu bem, com a estabilidade política e econômica que o país experimenta há bons oito anos. Kassab na verdade apenas ressuscitou o velho PSD criado por Getúlio Vargas para abrigar seus seguidores de perfil conservador, ao mesmo tempo em que colocou representantes dos setores populares e do sindicalismo “pelego” no Partido Trabalhista Brasileiro – o velho PTB, como alternativa aos comunistas. No mais, só mudança de rótulo e construção de fachadas cenográficas, para enganar os bestas. Para essa turma que rala desde a Batalha de São Mamede até agora, sempre acercada aos círculos do poder e com boquinhas ávidas pelas fartas tetas dos governos.

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