O que precisa ser
esclarecido e ajustado
sobre a pensão dos ex-governadores
No dia 24 deste mês de
setembro/2015, a sociedade norte-rio-grandense foi surpreendida com a publicação
no DOE/RN, de dois Atos Administrativos para “Regulamentar o recebimento” de subsídios
mensais vitalícios pelos Ex-Governadores Lavoasier Maia e José Agripino Maia, tendo
esse assunto gerado enorme repercussão negativa nas chamadas “redes sociais”,
tanto para o atual Governo que tem negado reajuste salarial aos servidores
alegando verdadeiro caos nas finanças do Estado, quanto para os próprios
beneficiários, que vêm sofrendo desgaste em virtude da não aceitação pela sociedade,
desse tipo de privilégio oriundo do abominável período ditatorial vivido neste
País.
Entretanto, ao
contrário do que parece, os tais Atos não tratam de uma concessão que esteja sendo feita agora pelo atual Governo, mas
apenas e tão somente da regulamentação
do recebimento desse benefício que já
vem sendo pago a cada um dos referidos Ex-Governadores desde que concluíram
seus mandatos nos anos de 1983 e 1987, respectivamente, o que pode ser
constatado no “Portal da Transparência” ou, para os órgãos de controle, a
exemplo do TCE, através das matrículas de cada um.
Esses subsídios
mensais vitalícios passaram a ser pagos aos referidos Ex-Governadores à época,
porque naquela ocasião (apesar do questionamento quanto ao princípio da
moralidade) havia previsão legal nesse sentido, cujo dispositivo específico era
o artigo 175 da então vigente Constituição Estadual, com a redação da sua
Emenda Constitucional nº 04, de 05.06.1974, que assim expressava:
“Art.
175. Cessada a investidura do cargo de Govenador do Estado, quem o tiver
exercido, em cumprimento integral ou parcial do mandato, fará jus, a título de
representação, a um subsídio mensal e vitalício igual ao vencimento do cargo de Desembargador do Tribunal de Justiça.” (originais sem
negrito).
Tratando-se então
de um benefício que já vem sendo pago de forma legal há mais de 30 (trinta)
anos, portanto Ato Jurídico Perfeito e Acabado fica difícil alcançar o porquê
da expedição dos referidos Atos Regulamentadores pelo Governo atual, até mesmo por
ser isso desnecessário à luz do Direito Administrativo (que sem dúvida é bem
dominado nos Órgãos Jurídicos do Estado), a não ser que tudo tenha sido
proposital, exatamente para provocar essa enorme repercussão negativa nas
“redes sociais” e consequente desgaste dos beneficiários, pois é notório que a
sociedade, mesmo sabendo que havia previsão legal para essa “pensão vitalícia”
dos Ex-Governadores do RN, sempre a classificou como i m o r a l.
Concluir pela possibilidade
de ser proposital a publicação dos mencionados Atos Regulamentadores pelo
Governo atual, se constitui uma decorrência lógica dos procedimentos que
ensejaram essa publicação, pois a análise dos tais procedimentos, mesmo que de
forma perfunctória, não tem como levar a outra dedução, senão no sentido da
completa desnecessidade da expedição dos referidos Atos Regulamentadores.
Vejamos:
a)
essa
publicação foi definida nos autos do Processo Administrativo - Protocolo nº
107220/2014-4, formalizado em 20.05.2014 (consulte em Protocolonet), através do
qual os interessados solicitaram o reajuste dos seus subsídios ou pensão vitalícia
que até agosto/2015 estava sendo paga no valor de “apenas” R$ 21.914,76,
portanto um pouco menor que o subsídio de um Desembargador do Tribunal de
Justiça, o que contrariava, aparentemente,
o montante estabelecido no acima transcrito dispositivo legal permissivo do
benefício;
b)
recebido
esse processo revisional citado na alínea “a”, foi determinado que a ele se
apensasse os antigos processos originários da concessão dos benefícios aos
referidos Ex-Governadores, sendo então informado que aqueles processos
originários haviam sido extraviados, informação essa que levou a PGE a sugerir
a expedição desses tais Atos Regulamentadores, quando bastaria sugerir a
simples reconstituição dos autos extraviados, o que pode e deve ser feito com
documentação mínima que esteja em poder dos beneficiários e do próprio Poder
Público nos assentamentos funcionais desses beneficiários, isso sem falar que a
revisão envolve matéria estritamente de direito, bastando para isso que se
tenha os contracheques mostrando os valores que estão sendo pagos e a
legislação regulamentadora desse pagamento. Onde está então a necessidade de se
expedir novos atos? O corpo Técnico-Jurídico do Estado desconhece algo tão simples
e corriqueiro?
O certo é que, independentemente
do extravio dos processos e de ter os beneficiários solicitado a revisão das
suas pensões vitalícias, essa revisão já deveria ter sido feita há anos pelo
próprio Estado, automaticamente, isso em razão das alterações legais que ao
longo do tempo atingiram esse benefício dos Ex-Governadores, devendo essa
revisão começar verificando se o benefício sempre foi pago no valor do vencimento do cargo de Desembargador
como diz expressamente o dispositivo legal autorizador da concessão (CE de 1974
– art. 175), ou se no valor total da remuneração daquele cargo, haja
vista que até a edição da Lei complementar estadual nº 213, de 07.12.2001, essa
remuneração era composta pelo vencimento
e pela representação, sendo esta última parcela de valor sempre maior que a
primeira.
Outra verificação
que também não poderia ter deixado de ser feita é quanto ao Teto Remuneratório
estabelecido pela Constituição Federal no seu artigo 37 inciso XI, com a
redação da Emenda Constitucional nº 41/2003, que limita para os Estados, desde
01.01.2004, remuneração e subsídio em valor máximo equivalente a 90,25%
(noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento) do subsídio mensal, em
espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, limitação essa relativa a
qualquer espécie remuneratória proveniente da relação de trabalho com o Poder
Público e que seja recebida “cumulativamente ou não”, o que significa dizer, no
presente caso, que se faz necessário saber quanto os dois beneficiários recebem
do Senado e/ou da Câmara Federal, seja a título de remuneração pelo exercício
de função pública em atividade ou de proventos por inatividade, para
somente assim saber se ainda resta algum valor a ser pago pelo Estado. Essa
determinação está complementada no artigo 9º da mesma EC nº 41/2003, que manda
aplicar a essa questão do Teto o art. 17 das Disposições Transitórias da
Constituição Federal, estabelecendo este último dispositivo: que toda espécie
de vencimentos “que estejam sendo percebidos em desacordo com a Constituição
serão imediatamente reduzidos aos limites dela decorrentes, não se admitindo,
neste caso, invocação de direito adquirido ou percepção de excesso a qualquer
título.”
Finalmente, não
seria demais lembrar, que essa vinculação do valor da pensão vitalícia dos
Ex-Governadores do RN com os subsídios do cargo de Desembargador, já não mais
subsiste desde o advento da Emenda Constitucional nº 19, de 04.06.1998 que, alterando
o inciso XIII do artigo 37 da Constituição Federal, assim estabeleceu:
“é vedada a vinculação ou
equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para efeito de remuneração de
pessoal do serviço público”.
Constata-se, pois,
que aqui houve a modificação de um regime jurídico e, considerando que a
jurisprudência já é unânime no sentido de que nessa hipótese não há direito
adquirido, parece não haver dúvida de que o pedido de revisão dos referidos
Ex-Governadores não faz nenhum sentido, assim como também não faz nenhum
sentido a edição dos tais Atos Regulamentadores publicados no DOE/RN de
24.09.2015 pelo Governo atual e muito menos se justifica a falta de revisão que
o Estado vem deixando de fazer nessas pensões para adequá-las ao novo
ordenamento legal pertinente. Para isso não precisa manusear os processos
originários, posto que os respectivos contracheques estão sendo gerados
mensalmente e a legislação regulamentadora se encontra ao alcance de qualquer
pessoa. Dizem as boas línguas, que a folha de pagamento do Estado do RN está
recheada de situações equivalentes.