DEMAGOGIA CONSTITUCIONAL
Paulo
Afonso Linhares
Maior
inspiração não há que escrever este artigo despretencioso aboletado numa mesa
do restaurante Mondego, na Avenida Atlântica número 2.936, Rio de Janeiro,
depois de passar quatro horas seguidas a ouvir previsões bem sombrias de
operadores do mercado financeiro acerca do desempenho da economia brasileira
neste segundo semestre de 2013. E depois de saber que o próprio Banco Central
do Brasil revisou suas metas para pior: menos crescimento e inflação maior. Nem
a belíssima imagem da Baía de Guanabara, com suas ilhotas distantes e o intenso tráfego de enormes navios afasta da mente os sobressaltos que os desarranjos
econômicos aliados à componente política explosiva das recentes manifestações
de protesto ocorridas em todos os Estados da Federação, muitas delas
acompanhadas de fortes confrontos entre as tropas de choque das polícias
estaduais e vândalos infiltrados nesses movimentos. Claro, um dos efeitos
colaterais dessas manifestações populares, além de acuar as autoridades federais
e estaduais, tem sido a desconfiança do mercado financeiro, com um agravamento
das baixas ocorridas na Bolsa de Valores de São Paulo, apesar de ser impossível
uma avaliação mais precisa dos impactos das manifestações no mercado de ações e
títulos mobiliários.
O
Governo Federal, através de intervenções pontuais do Banco Central, tenta
inutilmente deter a alta da moeda norte-americana, o que prejudica as
importações brasileiras e agrava a situação daquelas empresas que têm dívidas
indexadas ao dólar, ademais de favorecer isto o recrudescimento inflacionário.
Estranho é que a economia norte-americana dá sinais de recuperação, o mesmo
ocorrendo na zona do Euro, enquanto a brasileira começa literalmente começa a
embicar. O grande dilema dos governos, seja daqui ou de países da Europa, é
como garantir o acesso de um enorme contingente de jovens ao mercado de
trabalho, porquanto uma série de fatores tornam difícil a criação do novos
postos de trabalho, inclusive aqueles que determinam o corte de custos como
fator de aumento da produtividade na indústria e permite que os produtos possam competir no mercado global.
Outra
questão impeditiva de ampliação do emprego nos dias atuais é a crescente dispensa ou
substituição da mão-de-obra em face das inovações tecnológicas, na indústria ou
no setor de serviços, em suma, são as máquinas que de nada reclamam, que não
adoecem, não fazem greves nem engravidam, além de fazer algumas tarefas como
mais perfeição e maior rapidez que os seres humanos, que passam a ocupar o que
seriam postos de trabalho. As inovações tecnológicas têm igualmente impacto no
aumento da produtividade/redução de custos que resultam numa maior
competitividade dos produtos "made in Brazil". Como resolver isto? Difícil, pois está acima das decisões de
governo e constitui pano de fundo das relações comerciais do mercado mundial.
O
Brasil vive hoje os males da abissal distância entre intenção e gesto: fizemos
uma Constituição demagoga, em que o Estado super paternalista garante uma pauta
de direitos (à saúde, à educação, ao lazer, à moradia, ao trabalho ou à
segurança etc.) impossível de ser materializada num contexto econômico em que a
geração de riquezas é insuficiente e mal distribuída socialmente. Numa
linguagem mais singela, seria assim como aquela família que sempre fazia
demoradas reuniões de "planejamento", nas quais pais e filhos
construíam fantasias de consumo, como a compra de automóveis, casas e a realizar
viagens turísticas maravilhosas, porém, tudo se esvaía como fumaça ao vento quando
batia a realidade: de onde sairia o dinheiro para bancar essas metas
planejadas? Assim, não adianta exigir do Estado que banque políticas públicas
que, embora transformadas em garantias constitucionais, a economia do país seja
incapaz de gerar as riquezas para custeá-las.
Aliás,
tem sido usual que membros do Ministério Público e do Judiciário busquem coibir
o Poder Executivo (da União, Estados e Municípios) a arcar com custos nas áreas
de saúde e educação, com base nas "promessas" da Constituição. O financiamento
das políticas públicas é feito sempre
pela sociedade, que carreia recursos para o Estado pela via da
tributação, cabendo a este sempre uma posição de intermediário: somente pode
repassar para a população, na forma de serviços essenciais, aquilo que consegue
arrecadar da sociedade. É rematado
equívoco pensar que o Estado teria fontes de financiamento diversas da
sociedade, da qual nada mais é que a expressão maior de organização política.
Assim, se dinheiro não nasce em árvore nem cai do céu como o maná bíblico,
acreditar no que "promete" a Constituição serve apenas para gerar
falsas expectativas e represar insatisfações, inevitavelmente alargando essa
distância entre o imaginário das coisas e a realidade da vida.
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